O juiz federal Waldemar Cláudio de Carvalho, da 14ª Vara de Justiça no Distrito Federal, deferiu uma liminar no Distrito Federal na sexta-feira (15) que, na prática, permite aos psicólogos oferecerem tratamento para “reversão da homossexualidade”. A decisão atendeu ao pedido da psicóloga Rozângela Alves Justino em processo aberto contra o colegiado, que aplicou uma censura à profissional por oferecer a terapia aos seus pacientes. Segundo Rozângela e outros psicólogos que apoiam a prática, a Resolução do Conselho Federal de Psicologia (CFP) restringia a liberdade científica. Em nota, o CFP se posicionou contra a decisão e afirmou que iria recorrer. O juiz publicou uma nota negando que considera a doença passível de tratamento, mas que estaria impedido legalmente de comentar decisões sobre processos em curso (leia nota do juiz no final do texto). Além dessa decisão, considerada por pesquisadores e ativistas da causa LGBT como um retrocesso, o juiz Waldemar de Carvalho tem um histórico de decisões polêmicas e curiosas.
Em versos
Em uma sentença de 26 de maio de 2016, decidiu abandonar a formalidade do texto jurídico e usou a poesia para cancelar a multa aplicada pelo IBAMA a uma moradora de Brasília. Em 77 versos, o magistrado descreveu a história do processo, fundamentou a decisão, extinguiu a cobrança e ainda deixou claro que não havia necessidade de se ter gasto de dinheiro com esse processo na Justiça. Elisabete Ramos dos Santos tinha sido multada em R$ 5 mil por manter uma arara-canindé em cativeiro sem autorização ambiental. A acusada informou à Justiça que o pássaro pertencia ao irmão desde 1993, e foi herdado por ela após a morte do familiar. A idosa tentou entregar a ave ao Zoológico de Brasília em várias ocasiões, sem sucesso e, quando conseguiu entregar a ave na Polícia Civil, foi multada pelo IBAMA. O juiz Waldemar de Carvalho acatou o pedido da anulação da cobrança de multa e a extinção do processo. Confira a sentença em verso.
“Valor exagerado”
Em 6 de setembro de 2013, o juiz Waldemar de Carvalho reduziu de R$ 146 mil para R$ 500 a multa imposta a uma loja de artesanato que vendeu produtos com penas e dentes de animais silvestres causando danos ambientais. Segundo ele, antes de estabelecer a multa que a empresa deve pagar, o IBAMA precisa observar a realidade de quem paga, pois os produtos vendidos não alcançariam R$ 1 mil. A multa também significava cerca de 30 vezes o capital social da loja. O magistrado também afirmou que o valor foi exagerado no aspecto ambiental, pois não é necessário matar animais para conseguir penas e dentes, pois estes podem ser encontrados em ninhos abandonados ou em carcaças de animais que morreram naturalmente. Confira a sentença.
Nos carros
Em outra sentença proferida em 29 de outubro de 2015, o magistrado afastou a obrigatoriedade de implantação do simulador de direção veicular (SDV), previsto na Resolução n. 543, de 15 de julho de 2015, do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), como condição para formação de condutores de veículos automotores. O juiz Waldemar de Carvalho escreveu na sentença que ao tornar obrigatório o uso do SDV durante o processo de formação do condutor para obtenção da CNH, o Contran “extrapolou, e muito, o poder regulamentador previsto no. art. 12, incisos I e X, do Código de Trânsito Brasileiro, Lei n. 9.503, de 23 de setembro de 1997”.
A repercussão da decisão polêmica
A respeito da decisão deste mês sobre autorizar supostos procedimentos da psicologia para “reversão da homossexualidade”, chamou a atenção do Brasil inteiro. No despacho liminar, ele alegou que a proibição de atuar em favor da “cura gay” atentaria contra a liberdade profissional dos psicólogos. As entidades de direitos gays manifestaram seu repúdio. Os grupos ativistas LGBT, como o Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual e de Gênero e a Aliança Nacional LGBT afirmaram que ingressarão com processo para reverter a decisão. No Twitter repercutiu a hashtag #HomofobiaÉDoença, que alcançou o lugar de tema mais comentado.
“Propagação equivocada”
O juiz negou, em nota, que tenha autorizado tratamento de “reversão da homossexualidade” e afirmou que a propagação dessa informação é equivocada. No entanto, ele se julgou impedido de se manifestar para meios de comunicação visto que o processo está em curso.
Confira abaixo a nota na íntegra
“Nota da 14ª Vara Federal sobre o processo n. 1011189-79.2017.4.01.3400
Considerando a interpretação e a propagação equivocada acerca da decisão proferida por este Magistrado nos autos do Processo n. 1011189-79.2017.4.01.3400;
Considerando que em nenhum momento este Magistrado considerou ser a homossexualidade uma doença ou qualquer tipo de transtorno psíquico passível de tratamento;
Considerando ser vedado ao Magistrado manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento (art. 36, III, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional);
Considerando existir meio processual adequado à disposição das partes para pedir o esclarecimento de eventuais obscuridades ou contradições em qualquer decisão judicial (art. 1.022, I, do novo Código de Processo Civil);
Este Magistrado vem a público declinar dos convites a ele formulados por diversos meios de comunicação no intuito de debater ou esclarecer seu posicionamento acerca da questão. Espera-se a compreensão do público em geral, em especial daqueles que não tiveram a oportunidade de ler, em sua integralidade, a referida decisão, que se encontra disponível no sítio do TRF1
(http://portal.trf1.jus.br/sjdf/), em Notícias.
Cordialmente,
Brasília-DF, 21 de setembro de 2017.
WALDEMAR CLÁUDIO DE CARVALHO
Juiz Federal da 14ª Vara do DF”
Por Claudia Sigilião e Leonice Rezende
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira