Vaquejada: entenda a polêmica que separa tradição e proteção de animais sob decisão no STF

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Na prática, os vaqueiros precisam derrubar o boi em uma faixa do campo. Foto: Tatiana Azeviche / Governo da Bahia

Abre-se a porteira. O boi é solto e corre pelo campo. Ao lado, dois vaqueiros a cavalo precisam puxar o rabo do animal e derrubá-lo em um trecho da pista demarcada. Quem consegue… Comemora: “Valeu o boi”.  A prática dessa tradição das vaquejadas está em xeque no país por conta de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que tornou inconstitucional a lei estadual no Ceará. Com a decisão, manifestações de vaqueiros eclodiram e o assunto tornou-se polêmica no Brasil. De um lado, os vaqueiros que sobrevivem desse esporte lutam pelo direito de continuarem com a sua cultura de mais de 100 anos. Do outro lado, ambientalistas e ativistas defendem os direitos dos animais de não sofrerem atos de crueldade e maus tratos.

A auditora fiscal de controle ambiental do IBRAM (Instituto Ambiental de Brasília), Karina Torres, participou da decisão judicial ao enviar para o ministro vice-presidente do STF, Dias Tofolli, um documento em que reuniu diversas pessoas que se posicionam contra a vaquejada. “Não existe vaquejada sem haver maus tratos aos animais envolvidos”, afirma Karina. Mesmo assim, o ministro votou a favor da prática. Segundo ela, um bovino sair correndo não é uma característica natural da espécie e, por isso, muitas vezes se utiliza choques, objetos pontiagudos e outras formas de apavorar esses animais.

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Vaqueiros fazem campanha em Brasília contra decisão que suspendeu a vaquejada. Foto: Gustavo Andrade

A médica veterinária Fernanda Zanini considera a questão dos maus tratos dentro de um limite aos picos de stress do animal. Segundo ela, picos de stress são momentos de adrenalina que todos os animais sentem e que, se expostos à força sob essa situação, caracteriza-se como maus tratos. No caso da vaquejada, a veterinária reconhece que a prática é oriunda do trabalho no campo e que por anos foi-se necessário para o homem puxar o boi pelo rabo para retorná-lo ao rebanho, porém “quando você transforma algo em um esporte, você deixa de fazer as obrigações e começa a tornar aquilo mais circense, mais atrativo ao público. Cada vez mais se fica menos preocupado com o que você tá fazendo e mais preocupado em ser atrativo ao público, então começam a exagerar, a fazer mais rápido, a ser mais forte, mais pesado”.

“Vou matar e vou roubar”

Segundo os defensores da atividade, o esporte é catalogado em todo o Brasil, gera mais de 3 milhões de empregos e acontecem aproximadamente 4 mil vaquejadas por ano. Para o advogado e presidente da Associação Paraibana de Vaquejada, Valter Trigueiro Papel, não há maus tratos com os animais envolvidos durante toda a prática. “Evidentemente houve uma reformulação a adequação a norma ambiental. Procuramos nos aperfeiçoar com todo o manejo dos animais para as provas e de fato não existe mais a questão dos maus tratos”, explica o advogado, que é também vaqueiro. Ele afirmou que existe hoje uma tecnologia para proteger a cauda do boi, o que evita a ruptura da maçaroca do boi, a extensão do rabo do animal.

Acabar com a vaquejada é um problema para quem depende do esporte como meio de vida. No Nordeste, existem cidades inteiras que sobrevivem dessa prática e devido à seca, as alternativas de se obter renda são escassas. É o caso de Cachoeirinha, município de Pernambuco, onde vive o vaqueiro Tiago Henrique. “Se acabar a vaquejada, então dá um emprego pra nós… Lá a gente não tem, tá seco! Na hora que chegar em casa e for lá na minha cozinha, no guarda comida e não tiver nada, e ver meu filho com fome, só tem uma coisa: eu vou matar e vou roubar”.

Por Gustavo Andrade

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