Sol, seca, calor. No mês de setembro de 2014, as madrugadas registraram mínima de 19ºC e, durante o dia, a máxima foi de 41ºC, segundo o Instituto de Meteorologia (Inmet). Com a umidade baixa, aumentam as dificuldades daqueles que trabalham debaixo do sol forte. Mas a secura não é o único empecilho para quem leva a vida como trabalhador autônomo em Brasília.
Raulys Araujo do Santos, de 25 anos, veio do Maranhão quando tinha 10 anos. Desde os 12, trabalha em frente à Catedral vendendo lembranças a turistas. Raulys afirma que não tem do que reclamar. Pai de dois filhos, Rian (7) e Natasha (2), ele disse gostar do trabalho. E afirmou que tira um bom dinheiro por semana. “Tem vezes que dá pra tirar R$ 2 mil na semana”.

Para Raulys, o problema maior é a fiscalização. Segundo o camelô, uma vez perdeu toda a mercadoria em vistoria da Agência de Fiscalização do Distrito Federal (Agefis). De acordo com Raulys, o valor do material apreendido era de R$ 4 mil. Apesar das dificuldades, Raulys confessou preferir o emprego ambulante do que um com a carteira assinada. “Trabalhador com carteira vive endividado”.
O sol forte não é um empecilho. “Eu já acostumei”. Ele, que há 13 anos trabalha de sol a sol em frente à Igreja do comunista ateu Niemeyer, disse que não usa proteção contra o calor. “Não uso protetor, não gosto de boné… Aqui é só no sol forte mesmo”.
Domingos Lopes, de 51 anos, também trabalha na Catedral. Ele vende picolé e água para os visitantes, mas reclama do calor, da falta de amparo e do sol forte. Domingos trabalha nos horários em que a incidência de raios solares é a maior. Chega ao serviço por volta de 9h e só sai às 17h. O vendedor diz que não gosta da condição de trabalho. “O sol é muito forte, tudo é muito quente”.
Ele veio do Piauí para Brasília em 1986 em busca de emprego. Mas ao chegar na capital, percebeu que não seria tão fácil. “Não tinha estudo”. Faltaram opções de emprego para Domingos. E ele, que na época já era casado, recorreu às ruas para por comida em casa.
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Apesar de não ter participado da vida acadêmica, o ambulante incentivou os filhos a estudar. Dos seis filhos Domingos demonstra orgulho em poder dizer que matriculou um filho em uma universidade particular da Asa Norte. Segundo o vendedor, o filho deve se formar em Direito ainda no próximo ano. “Ah, é muito orgulho né, meu filho é doutor”.

Aos 18 anos, Alexandre Pereira da Cunha, como tantos outros adolescentes, entrou para a Universidade de Brasília. Contudo, havia uma diferença entre Alexandre e os colegas. O jovem não tinha feito vestibular, não estava ali para estudar, não estava atrás de diploma.
Alexandre entrou na UnB para ser lavador de carros.Hoje com 30 anos, avisa que a maior parte da “carreira” fez no ICC Sul (também conhecido como minhocão). Ele se formou na “escola da vida”, onde não é possível colar, nem trancar o curso, não se encerra a cada semestre e há uma prova final todos os dias.

Pai de um menino de três anos. Ele se orgulha do trabalho que faz na universidade. “Faço isso aqui com dedicação”. Morador de Planaltina, ele levanta às 4h30 todos os dias para chegar por volta das 7h e só sai às 20h.
Sem carteira assinada, o trabalhador luta para pagar o INSS e, assim, poder se aposentar. Alexandre afirmou que faz o melhor que pode para se destacar. Ele se orgulha da confiança que adquiriu com os clientes e exibe as chaves dos carros, que conhecidos deixam com ele.
O trabalhador acrescentou que nesses 12 anos desde que começou a lavar carros, ficou dois anos fora, para trabalhar em uma rede de supermercados. Mas, para Alexandre, compensa mais trabalhar como lavador. “Aqui tem vezes que tiro mil reais”, confessou.
Alexandre admite que gostaria que seu filho estudasse. Apesar de trabalhar em uma universidade federal, ele almeja ter condição financeira suficiente para poder bancar uma faculdade para o filho e guarda grandes ambições para o primogênito. “Já pensou ele ser presidente?!”.
Manoel Messias, de 34 anos, vende frutas na estrada dos condomínios do Jardim Botânico. Ele diz que é difícil aguentar o calor. “Tomo cinco litros de água por dia, às vezes mais”. Manoel já vende frutas nas ruas há 12 anos, mas mesmo assim não descansa.

Ele mora no Riacho Fundo, acorda às 4h30 da manhã e vai para a Ceasa comprar o estoque de frutas do dia. O expediente só se encerra quando todos os morangos – fruta da época – são vendidos.
Ele não nega de que a secura e o calor causam, às vezes, mal estar e desconforto para quem exerce a função diária exposto às temperaturas. Manoel tenta se proteger do sol embaixo de um toldo, no qual abriga as frutas. Mas ele garante que gosta do que faz. Há sete anos, estabeleceu o ponto no Jardim Botânico e já tem uma clientela fiel que sabe da procedência dos produtos.
Welington dos Santos, de 34 anos, trabalha no setor de jardinagem da Universidade de Brasília. O rapaz deve regar o gramado do Bloco de Salas de Aula Sul (BSA) por volta das 14h. Ele afirmou que o sol incomoda. Segundo o jardineiro, o horário é ruim para regar o gramado.

Há cinco anos como jardineiro, Welington afirmou que prefere trabalhar nos jardins do que o antigo emprego: gari. “Quando é plantão, é comum trabalhar 14h sem parar para comer”, no tempo em limpava as ruas.
Para o trabalhador, a maior dificuldade do serviço é capinar. “O mais puxado é a enxada mesmo… Na enxada e na foice, é que não tem jeito”. Welington acrescentou que é refrescante molhar os gramados, ajuda a se proteger do calor. O jardineiro disse o que mais gosta no trabalho: “os amigos que fiz por aqui”, revelou.
Fotos: Jade Abreu